sábado, 17 de novembro de 2007

Deixo-os

As vezes percebo de um jeito bastante forte, ainda que pueril, que tudo que fiz na vida até hoje foi gastar-me. Gastei meu corpo e minha saúde com comidas extravagantes, com bebidas altamente calóricas ou alcoólicas, com corridas desnecessárias, com excesso de sol, as vezes de chuva, com uma inércia absoluta daquelas de dar dó. O meu tempo gastei com esperas em dentistas, filas, cinemas, ou com conversas demais, ou aulas demais, ou sono demais, e fui gastando aceleradamente, com muito esforço de gasta-lo pela vida a fora e com eficiência, até que algumas vezes percebi que ele não é gastado, mas ele próprio se gasta na gente e continua a gastar-se. Percebo que gastei meus sentimentos, jogando-os nas horas erradas, nos dias errados, nos amores errados, gastei-os com tanto prazer e felicidade num momento que me parecia tão válido e propício, mas que hoje ao me mover a gasta-los percebo que eles já estão gastos, como se feridos houvessem cicatrizado, deixando marcas. Percebo que meus sentimentos estão gastos porque neles já não posso mais confiar, percebo que eles não são vivos, ele sse força a viver e eu o forço a viver, enquanto que ele mesmo não se faz de vivo, e talvez nem mesmo exista, entretanto penso que devo agradecer por assim ser, pois pelo menos penso sobre eles e sou sincero com eles. Deixo-os sempre em jogo, abertos, como chuteiras velhas à espera do camisa onze que chega, deixo-os em mim, onde sempre os levei. Deixo-os para sempre poder usa-los, deixo-os como quem deixa uma casa, ou uma esposa, deixo-os podendo sempre voltar. Mas deixo-os

2 comentários:

Leonardo Werneck disse...

Mas ainda bem que dá tempo de correr atrás do que se perdeu...


abraço

Unknown disse...

As vezes, gastar-se eh uma forma de doar-se sem perceber.

Me ensina esta arte de deixar q eu quero aprender.

Abracos.